Então, virei gente grande. Deveria ingressar numa carreira profissional, o que está intimamente ligado a fazer uma faculdade. Aí virou uma grande bola de neve: pra fazer faculdade na minha cidade, tinha que pagar, e bem. Não tem empregos que paguem bem quem está começando, a ponto de poder pagar uma facul de bio ou farmácia, como foi minha idéia inicial; não ter que pagar facul, só federal. Pra fazer federal, tinha que fazer cursinho e estudar bastante, sem trabalhar. Pra quem fez o terceiro ano noturno pra poder trabalhar pra pagar uma mensalidade de R$80,00, não dava pra ter paitrocínio, a coisa tava meio escura lá em casa naquela época.
A realidade me pegou de jeito. Depois de anos formada, não tinha a menor perspectiva de nem mesmo começar a facul. Nos lugares que trabalhei, recebia muitos elogios e pouco dinheiro. Sem nenhuma perspectiva de começar a ganhar legal e nem de estudar. Enquanto isso, aqui em São Paulo, as pessoas da minha família indo muito bem, obrigada. Então, num trabalho de 45 dias em São Paulo, ganhei o que demoraria exatamente cinco meses pra ganhar no “oásis”. Comecei a rever meus conceitos...
A cidade é violenta porque tem muitos assassinatos, assaltos e blá blá blá. Verdade. Mas proporcionalmente falando, não acho que seja não. Estamos falando de 18 milhões de habitantes, e toda Santa Catarina não tem nem metade disso. Qualidade de vida é algo extremamente relativo. Se ferrar um pouco (bastante) no começo (momento em que estamos agora) e estar bem depois, isto sim é qualidade de vida (momento que ainda temos chão pra chegar). Mas o se ferrando não é diferente do que estávamos em SC, então tudo bem, tudo na mesma. Mas agora existe algo real que só existia na minha imaginação: perspectiva. E se qualidade de vida é natureza, belos parques não faltam aqui.
Hoje, acredito que esse termo foi inventado pelos caras que se ferraram a vida toda, ficaram muito ricos e hoje estão hoje morando no litoral ou interior catarinense, vivendo de juros; e dizem agora que aquela cidade é uma loucura, não dá pra se viver lá. Agora é fácil falar isso.
Isso é o que mais acontece por aqui. Junta-se grana e vai embora. Como meus tios. Se ferraram muito, mas agora estão indo morar em Aracaju, comer muito caranguejo e tomar água de coco. Fruto de apenas dois anos de economias. Ah, porque tem esse detalhe também. O ganhar bem daqui é muuuuito diferente do ganhar bem em SC. Pra exemplificar: minha prima estava comentando um dia conosco de uma vaga que abriu na empresa que ela trabalha. Pergunto:
-Paga bem?
-Ah, mais ou menos...
-Quanto?
-Uns sete mil... sete meio...
E descobri que a vida aqui não custa mais não. Gasta-se um pouco mais com transporte e só. É que como a cidade oferece muita coisa boa, é muito, muito fácil mesmo gastar.
Claro que pode acontecer o contrário, mas você tem que ter visão e uma pitada de sorte pra fazer algo acontecer numa cidade pequena. Muita visão. E são poucos os que têm. Casos raros.
Quando vim pra cá escutei que eu era louca, que todo mundo quer sair de lá e eu querendo ir. De gente de Santa Catarina e principalmente daqui. Que lá é um paraíso, lá se tem a famigerada “qualidade de vida” (as pessoas realmente não deveriam usar esse termo sem pensar bem antes). Sempre falo uma coisa que ninguém conseguiu me argumentar o contrário até agora: paraíso sem dinheiro é pior que inferno. Como tudo no mundo capitalista, tudo deve ser comprado, inclusive a qualidade de vida nos lugares em que se supõe que exista naturalmente.
Se na pior das hipóteses eu voltar pra Santa Catarina, estarei com a consciência tranqüila de que pelo menos tentei. E qualquer coisa posso usar novamente o papo de qualidade de vida do yellow brick road.